Balança de Marin-Mersenne



156 x 45,5 x 21
Madeira esculpida, aço e latão

 INDEX 1788 : I.V.181

Bilanx Pat. Marini Mersenni, quae optime repraesentatur a Fig. 4. Tab. XXXV. Physices Elem. S Grav. et ab eodem describitur pag. 292. 1072.

Balança de P. Marin Mersenne que está optimamente representada na Fig. 4, Tab. XXXV. É descrita nos Physices Elementa de 's Gravesande e pelo mesmo na pág. 292, parágrafo 1072. 

Trata-se de um exemplar da célebre balança de Marin-Mersenne, um aparelho destinado a avaliar as "forças que animam os corpos em movimento". O assunto é da maior importância não só em si mesmo, pelo proveito que poderá tirar-se do seu conhecimento, como pelo significado que adquiriu na história do pensamento científico. Durante os séculos XVII e XVIII o assunto foi debatido com aceso entusiasmo e na discussão colaboraram alguns dos mais notáveis físicos e filósofos.

Admitiam os físicos desta época que os corpos em movimento iam animados de "forças", cuja avaliação se poderia fazer, indirectamente, apreciando os efeitos que produziam. O que está em causa é, como se depreende, o conceito de energia e não o de força. De longa data preparava-se o espírito para a eclosão do conceito de energia, mas, enquanto não se alcançou o amadurecimento suficiente para o formular, foi uma luta angustiosa porque as palavras não chegavam para se exprimir o que se pretendia e os raciocínios enredavam-se numa teia confusa.

Descartes, pretendendo avaliar as "forças que animam os corpos em movimento" pelos efeitos que produzem, concluiu que poderia fazê-lo a partir do conhecimento da massa do móvel e da velocidade que possuía, e que essa "força" seria proporcional a qualquer dessas grandezas. Descartes identificava assim a "força" com a "quantidade de movimento" possuída pelo corpo. Ao lado de Descartes encontravam-se alguns nomes célebres como o do padre Mersenne, Gassendi, Desaguliers, Maclaurin, Mairan, Jurin, Varignon, etc.

Por seu turno, Leibniz discordava de Descartes quanto ao processo de avaliar as "forças que animam os corpos em movimento". Segundo Leibniz estas "forças", por ele designadas como "forças vivas", deveriam ser avaliadas multiplicando a massa pelo quadrado da velocidade.

A nova doutrina levantou espantosa celeuma que se prolongou, acesa, por cerca de um século. Ao lado de Leibniz enfileiravam-se nomes tão ilustres como os que lutavam nas hostes cartesianas. Aí encontramos Johann Bernoulli, Wolf, 's Gravesande, Bulsinguer, e outros. A luta estendia-se ao campo teórico e experimental e os mesmos aparelhos que, nos Gabinetes de Física, demonstravam a correcção da teoria de Descartes, também demonstravam, nas mãos dos contrários, que a doutrina de Leibniz era a mais exacta.

Nas escolas, assim como nos compêndios, os mais cautelosos expunham as duas doutrinas, respeitando uma e outra por verem envolvidos na questão, em posições inimigas, homens de tão grande estatura. Assim faz Musschenbroek com justificada cautela. Não é o caso de dalla Bella que, no seu Physices Elementa editado em 1789, ensinava que a doutrina de Leibniz estava totalmente errada. Já Teodoro de Almeida, cinco anos antes da publicação dos Physices Elementa, afirmava no Tomo II das Cartas Físico-Mathematicas, ao seu discípulo Eugénio: "Eu amigo Eugenio tambem tive grande repugnancia a concordar com Leibnitz, e rejeitar o modo de avaliar as forças pela quantidade de movimento: e pela repugnancia que sentia, e pelos motivos, que me embaráção a mim, julgo o motivo, que embaraça os demais, e os faz a nosso modo trepar por paredes assima, para concordar com a sua doutrina as experiências, que todas provão o contrário".

É bem conhecido o nome do padre mínimo, Marin - Mersenne (l588-1648), amigo íntimo de Descartes, cuja cela servia de centro de reunião para a discussão de temas científicos e foi o germe da futura Academia das Ciências francesa. Imaginou Mersenne uma balança, a que se acrescentou o seu nome, destinada a avaliar os efeitos das "forças".

A balança de Mersenne é formada por um travessão de braços iguais donde estão suspensos os pratos a níveis bastante diferentes. O que fica mais abaixo cobre-se de argila mole, de superfície muito lisa, com cerca de uma polegada de espessura, sobre a qual se fará cair uma esfera que está inicialmente suspensa da extremidade do mesmo braço do travessão. O prato superior tem por baixo dele um outro, de madeira, ligado à coluna que suporta a balança, do qual dista muito pouco quando o travessão está horizontal.

Começa-se por equilibrar a balança colocando pesos no prato superior e tendo, no outro, a esfera suspensa a certa altura. Cortando o fio que a suspende, a esfera cai sobre a argila fazendo nela uma cova cuja profundidade depende dessa altura e do peso da esfera utilizada. Procura-se então qual o máximo peso que se deverá usar, susceptível de saltar no prato quando a esfera cair, no outro prato. Repetindo a operação com a mesma esfera, largada de várias alturas, procura-se estabelecer uma relação entre os valores dessas alturas e os respectivos valores dos pesos que saltam quando a esfera cai.

Mersenne conclui que as alturas das quedas estão na razão directa dos quadrados dos pesos máximos que se consegue fazer saltar. 's Gravesande, repetindo as experiências, chegou a outra conclusão, afirmando que os valores obtidos são directamente proporcionais entre si.

A balança apresenta um pormenor que se destina a determinar, com certa segurança, o valor do tal peso máximo susceptível de saltar. Consiste num esquadro de ferro e numa lâmina flexível presa ao esquadro por uma extremidade. Endireita-se a lâmina e entala-se a sua extremidade livre, entre o esquadro e o travessão da balança. Desde que o braço do travessão se eleve, por pouco que seja, a mola salta, o que facilita a determinação dos valores dos tais pesos que se devem colocar no prato.

A balança é originária do Colégio dos Nobres, onde tinha o número 171.

Carvalho, Rómulo de, História do Gabinete de Física da Universidade de Coimbra, Coimbra, 1978, pp. 329-334.
's Gravesande, Willem Jacob, Physices Elementa, Leiden, 1742, Tomo I, § 1072, Tab. XXXV, Fig. 4.


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